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30 de janeiro de 2009

Frágil Argamassa


Considere a profissão do arquiteto:
Imagine-o conhecendo seus clientes, os futuros felizes moradores das casas por ele construídas.
Estes clientes o visitam com alguma regularidade, muitos se tornam mesmo seus caros amigos.
Casas (ou prédios, ou escritórios) construídas, clientes felizes, dinheiro no bolso do profissional, até que...
Bem, até que algumas casas caem, desmoronam mesmo, soterrando consigo seus ex-clientes, muitos deles seus ex-amigos e parentes.
Na grande maioria das vezes, não por culpa do arquiteto. Mas simplesmente porque, ora, às vezes casas caem! É, digamos, normal.
O conhecimento arquitetônico atual – o arquiteto aprende cruelmente durante sua formação – ainda não consegue (e provavelmente nunca conseguirá) manter em pé certos tipos de casa (ou prédios, ou escritórios). Deve ele no máximo sugerir algumas escoras.
“Não desanime”, “Não pire”, “Mantenha um saudável distanciamento” – aprende a dizer para si mesmo.
O que são alguns clientes “perdidos” quando suas casas caem? Então não há tantos outros clientes satisfeitos (embora alguns deles se afastem pela perda da sua reputação na queda de uma ou outra casa)?
Ânimo, vamos lá, que tem mais – a sorridente secretária avisa – ansiosos clientes à porta.

Você que não é médico, às vezes pense nisso.

“Ninguém cometeu maior erro do que aquele que não fez nada só porque podia fazer muito pouco”
Edmund Burke

27 de janeiro de 2009

Viver Pelo Prazer


“...E não há tempo que volte, amor,
Vamos viver tudo que há pra viver
Vamos nos permitir...”
(Tempos Modernos – Lulu Santos)

Sexo compulsivo, drogas, álcool, direção perigosa, “altos” sons. O que têm em comum?
Dão prazeres imediatos. São “patadas de cavalo” no cérebro, do mais puro prazer. E de efeito de curta duração. E que geram, após, duas sensações bem conhecidas nos jovens: certo mal estar e necessidade de mais (até para afastar a sensação de mal estar).
Não adianta espernear. A maioria dos jovens tende mesmo a buscar “sensações”. É da idade. É da vida. Até por – como já vimos (jovens têm seu lobo pré-frontal ainda em formação) – questões anatômicas e funcionais. Simplesmente se recusam a acreditar em conseqüências, em conceitos de poupança, em finitude (por este motivo, adolescentes muito certinhos nos dão a impressão de que não são lá muito “normais”).
Além disso, a liberação de uma determinada substância no cérebro, a dopamina, comum a todos estes prazeres, é mesmo “viciante”. E quando há maiores ou menores desequilíbrios em outros neurotransmissores (a dopamina, assim como a serotonina – o “defeito” acusado como principal responsável pela depressão – é um neurotransmissor), é como se a dopamina passasse a ser ainda mais potente em seus efeitos “high”.
Logicamente não devemos apenas nos conformar com a assunção de riscos. Uma palavrinha nos vem à mente quando se trata de contrabalançá-los: valores.
Há jovens que já os têm. Há outros que precisarão aprendê-los a duras penas. Há, ainda, outros, que parecem que são renitentes.
Paciência com estes.
(obs.: há teorias de que pessoas – de qualquer idade – que destroem suas vidas em busca de sensações possam ter níveis baixos de dopamina no cérebro – seriam os que viciam muito mais facilmente)

23 de janeiro de 2009

Cenas Familiares (Um)


- Meu filho, de novo no computador?
- ...
- Já não te falei que você anda ficando tempo demais na frente dessa tela? Isso vai fazer mal pra tua saúde, você sabe!
- ...
- Fica aí, que nem um zumbi, parado o dia todo, sem se mexer, engordando! Desliga esse negócio meu filho, vai fazer alguma coisa de útil! Jogar bola, andar de bicicleta, pular corda, sei lá...
- Mas, mãe, não tenho ninguém pra brincar comigo!
- Ninguém? Mas e o seu pai?
- Disse que tá muito cansado.
- E é verdade. Mas... Você não pode brincar sozinho?
- Sozinho é chato, mãe! E você, mãe, não quer brincar comigo?
- Filho, você sabe que a mãe agora não pode! Tá bom, tá bom! Só mais uma hora, hein? Depois desliga esse computador, OK?

20 de janeiro de 2009

Piscômetro


Já deu pra perceber que quando estamos muito interessados em ver alguma coisa (a vizinha trocando de roupa quando se tem 10 anos de idade é um bom exemplo), pouco piscamos.
É provavelmente o que acontece com crianças pequenas, foi o que descobriu um grupo de neurologistas (o GNDQNTNMF, “grupo de neurologistas desocupados que não tem nada melhor pra fazer”) em artigo antiguinho dos Anais de Neurologia de 1979 (quando eu e você provavelmente ainda piscávamos muito pouco).
A média de piscadas que nos adultos gira em torno de 15 a 20 por minuto, baixa a impressionantes duas piscadas por minuto nos bebês.
Além do interesse no mundo novinho em folha, outras prováveis explicações podem ser a imaturidade do reflexo de piscar e o maior tempo que se passa dormindo nesta idade.
Na última década, com o advento do computadorismo estamos voltando a piscar muito menos do que deveríamos. Trabalho apresentando em recente convenção de ergonomia na Suécia (outros desocupados!) mostrou que a média de piscadas ao computador (nos adultos) é de 10 por minuto. Um perigo (piscar protege os olhos ao recobri-los com uma camada de lágrima com dupla função: remoção de pequenas “sujeiras” e anti-séptica)!

16 de janeiro de 2009

Pare, Mas Não Fique Passivo


Quando aquela incômoda (e, em graus variáveis, incapacitante) dor de cabeça da enxaqueca vem, é importante saber o que fazer e - o que não fazer - com ela.
Dentre outras coisas, é importante reconhecer a dor de cabeça como crise enxaquecosa. Principalmente em crianças, os pais têm a tendência a não reconhecer este diagnóstico, impedindo dessa forma os benefícios do tratamento (buscando, por exemplo, diagnósticos mirabolantes, com desperdícios de energia e criando temores desnecessários na criança).
Outras medidas que beneficiam são:
◦ buscar ambiente calmo, com pouca ou nenhuma luz e silencioso (sugeriria um cartaz para afixar na porta do quarto do enxaquecoso: “Não perturbe, enxaquecoso repousando!”)
◦ não deixar de comer, mesmo se a náusea estiver incomodando, pois principalmente em crianças o jejum é fator precipitante importante
◦ não pensar catastroficamente em relação ao significado das dores (estilo: “estou com dor, é muito ruim, mas o meu mundo não vai acabar por causa disso”). Pais (principalmente mães) têm um papel importante aqui
◦ não deixar de usar analgésicos (pouco potentes e mais seguros, de preferência) ao perceber início de crise. Um erro comum é quase nunca querer usá-los “para não acostumar” o organismo. Bem usados, abortam ou diminuem crises mais intensas e dão confiança na melhora para as crianças.
◦ reconhecer os fatores precipitantes, principalmente em períodos mais susceptíveis

13 de janeiro de 2009

Maçante


Nigella parece nome de país africano. Mas é como se chama a bela gourmet rechonchuda apresentadora do programa de receitas do GNT, canal fechado, talvez você já tenha visto.
Não sei se viu também sua luta para perder peso num outro recente programa do mesmo canal.
Nele, a moça mostrava a tentativa frustrada de perder peso numa dieta que se constituía basicamente de frutas, numa das táticas a que mais se recorre para emagrecer (se você já quis perder peso também já deve ter feito).
Numa das cenas mais emblemáticas, Nigella, prato de maçãs verdes à sua frente (como único alimento da refeição) diz:
- “Bem, comendo este prato aqui, vou ficar sem fome por aproximadamente... 12 minutos!”
É isso aí. Refeição nada apetitosa, constituída por apenas um tipo de alimento, sem acompanhamento, sem nada, e ainda constituída basicamente por carboidrato. Um verdadeiro exército de um homem só*.
Sem gordura, sem proteína, com pouquíssima capacidade de saciedade duradoura. Sensação de estômago vazio vem logo (insulina faz um pico sangüíneo, “consome” todo o alimento rapidinho e ainda – por conta do próprio pico de insulina – provoca nova sensação de fome).
Nada mais tolinho.

* Referência ao divertido livrete de Moacyr Scliar. Se ainda não leu, recomendo.

9 de janeiro de 2009

Verdemais


Diferentes pessoas passando pela mesma rua vão notar coisas diferentes: um vê determinada casa, outro percebe mais a arborização do local. Outro pode não notar quase nada.
Imaginando que todos tenham boa visão, a diferença na percepção de cada um tem origem mais na capacidade de perceber (estado emocional, imersão nos próprios problemas, pressa, hábitos, etc.) do que no órgão responsável pela percepção (no caso, os olhos).
Embora muitas vezes não nos demos conta, o mesmo fenômeno ocorre em relação à dor.
Existe em cada um de nós um verdadeiro exército liliputiano de mensageiros (receptores) de dor, tentando mandar mensagens (leves, na maioria), nas 24 horas do dia: “Ei, dói aqui!”, “Ei, aqui também!”, “Ei, não esqueça que aqui dói um pouco menos, uma dor meio diferente, mas também dói!”.
Locais: na gengiva, por exemplo, por uma pequena retração. Ou no intestino grosso, pela distensão provocada por gases ou fezes. Ou, ainda, na coluna vertebral, pela sua má postura (lendo agora este pequeno texto), etc.
A percepção (o notar ou não estas pequenas mensagens) vai ser então muito diferente entre diferentes pessoas, entre diferentes estados emocionais (depressão, ansiedade, neuroses, etc.), em quem está cheio de outras idéias ou afazeres ou em quem está simplesmente “de bobeira”.
Do mesmo modo que uma maior sensibilidade ao estilo arquitetônico de determinadas casas não poder ser detectada pelos oftalmologistas (sua capacidade visual deve ser a mesma daqueles que “passam batido” pelas mesmas casas), também muitos dos que sentem dores vão apresentar vários exames (e, para alguns deles, haja exames!) absolutamente normais. Ou, o que é pior, alguns exames (se muitos forem pedidos) podem mostrar alterações que “não tem nada a ver”.
Apenas que no caso da diferença de percepção estética (ou visual), sentimo-nos conformados com o fato. Quando somos – ou estamos – mais sensíveis para as dores, temos muito mais dificuldade de nos conformar (“Não é possível, devo ter alguma coisa!”).
Nunca vi, por exemplo, ninguém solicitar tomografia do olho de quem se incomoda com a cor “demasiadamente verde” de determinada casa (pelo menos não até hoje, mas é bom não dar idéia...)

* (pra te poupar o Aurélio) Liliputiano: de Lilipute, país imaginário do romance “Viagens de Gulliver”, do escritor inglês Jonathan Swift, no qual os habitantes tinham apenas seis polegadas de altura.

6 de janeiro de 2009

Do Cóio


Ainda na série “amenidades”, que ninguém é de ferro, pôxa, inda tamo meio que de férias:

Poderosos transdutores de ondas eletromagnéticas cerebrais imaturas foram acoplados à superfície craniana de um pequeno lactente durante uma consulta rotineira ao temível pediatra. Eis a transcrição:

Ei! Já teve qui!
O Caia da Babicha. Casa coi-de-osa! Já teve. Não bão... Uhááá!!
Como faia: mãe, pai, Caia da Babicha. Mãe, pai, mãe, Babicha, pai, mãe de novo. Chega, gente. Vô... Uhááá!!
Não vem! Não vem! Veio, o Babicha. Sai de péito. Sai! Sai! Não pega. Sai... Sai óia, tô faando... Uhááá!!
Pai tá bobo (mai que sempi). Babicha pega. Pega muito. Bobo, também. Bobo e séio. Séio e bobo. Pega aqui. Pega ali... Como pega! Sóta, Babicha! Vô... Não! (deu peguiça!)
Deitado: Deitado, não bão. Abe falda. Abe falda, bão. Mai pica. Hoje pica? Não sabe. Babicha pica, não pica? Não sabe. Não sabe, então... Uhááá!!
Pai segúia. Mãe segúia. Faco, mai segúia. Uhááá!! Babicha não pica. Até agóia. Mai feio. Feio e babicha. Sai, Babicha! Coisa!

Babô!
Pai pega. Baiança eu. Janéia. Vento!... Babicha longe. Faia Babicha. Faia, faia, faia... Mãe qué faiá. Babicha não dêxa.
Babicha esquéve. Qué esquevê, qué esquevê! Qués’quevê!! Uhááá!!
Babicha dá caneta! Babicha bom. Bom e bobo.
Bom!... Bobo!... Bom!... Bobo!...
Tó caneta. Num quéio, tó!
Imbóia! Imbóia, mãe. Imbóia, pai, imbóia! Uhááá!! Imbóia!!
Tchau, tchau! Imbóia! Imbóia, bom! Tchau, Babicha! Babicha bom? (Pica?) Tchatchau!...
(Bão!...)

2 de janeiro de 2009

Babosa


Continuando na linha “amenidades de início de ano”:
Uma das coisas mais perigosas que a mídia nos ensina (bombardeia), principalmente em épocas como estas, é o tal do “Corra atrás do seu sonho”.
Ouvimos a baboseira a toda hora.
Tem uma turma que ainda mistura estações:
“Ah, eu corri atrás do meu sonho com unhas e dentes!”
(?)
Correr atrás do sonho é uma empreitada com sérias conseqüências pra muita gente, provavelmente para a maioria que o faz.
Meu caso, por exemplo.
Como muito menino, sonhava em ser jogador de futebol. Sonho até hoje na verdade. Maracanã cheio, vibrando com as minhas jogadas.
Devia ter ido adiante?
Com a minha habilidade, estaria hoje no máximo estampando as figurinhas do Bangu dos anos 80. Insuficiente pra sustentar as bocas lá de casa.
Aí é que está. Sonho impulsiona, anima. Dentro de expectativas realistas. Mas não “enche a pança”, fracassa, quando significa desvario.
Agora me dá licença que eu vou pegar a caipirinha.
Bons sonhos pra você.